Blumenau - Ao reconhecer que casais gays também formam famílias e garantir direitos como herança, pensão e partilha de bens, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) é vista por especialistas como uma das guinadas constitucionais mais importantes dos últimos anos. Além de equiparar uniões afetivas de qualquer tipo, a decisão tomada pela Justiça na quinta-feira deverá impulsionar novas mudanças em análise no Congresso.
A interpretação dada pelos 10 ministros que votaram a favor da equivalência entre sexos deverá ter efeitos profundos na vida cotidiana, mas também um forte peso simbólico. Para o advogado e professor universitário gaúcho Rolf Madaleno, integrante da diretoria do Instituto Brasileiro de Família (IBDFAM), a sessão do Supremo alcançou rara importância histórica.
– Considero essa a maior modificação legal no país desde que entrou em vigor a nossa Constituição de 1988. Desde essa época não havia um impacto tão grande nos direitos da sociedade – avalia.
Para o constitucionalista Eduardo Carrion, representa uma vitória do “Estado laico, do Direito, da democracia e da tolerância”. Segundo ele, após diversos tribunais terem se antecipado ao garantir direitos em ações isoladas, o STF deu um passo adiante ao considerar a união estável homoafetiva uma unidade familiar.
– As decisões anteriores não costumavam chegar a esse ponto. Isso revela que adaptar a Constituição não depende só de emendas, mas também do esforço de interpretação e aplicação – argumenta.
Igrejas, porém, criticam a nova interpretação. O arcebispo católico de Maringá (PR), Dom Anuar Battisti, afirmou que se trata de uma “agressão frontal à família”. Apesar da polêmica, na prática a manifestação do Supremo elimina as divergências entre juízes brasileiros sobre direitos como pensão por morte, pensão alimentícia, herança e partilha de bens, entre outros.
Outros 16 projetos tramitam no Congresso
Alguns dos efeitos devem ser sentidos automaticamente, como a possibilidade de incluir o nome de uma pessoa do mesmo sexo como dependente em qualquer documento. Porém, parte dos casos ainda dependerá da Justiça. Determinadas situações, como partilha de bens, herança ou tentativa de adoção, por exemplo, costumam se desenrolar por meio de processo jurídico. Mesmo assim, conforme a desembargadora aposentada e advogada Maria Berenice Dias, a mudança é significativa.
– Mesmo que seja necessário ir à Justiça, agora os casais homossexuais farão isso em igualdade de condições igual a qualquer outro casal – esclarece a advogada.
A decisão da Justiça brasileira deverá ainda favorecer novas conquistas por parte dos homossexuais no país, principalmente por meio de 16 projetos em tramitação no Congresso. Um dos principais criminaliza atos de discriminação sexual, a chamada homofobia. Hoje, só há sanções para esse ilícito no âmbito civil.
– Uma das propostas prevê a criminalização da homofobia. Acredito que a manifestação dos ministros do STF, que enfatizaram o direito à liberdade, cria um ambiente favorável para a aprovação de novas medidas – aponta o juiz federal Roger Raupp Rios.
O IMPACTO PRÁTICO DA DECISÃO
1) É preciso registrar a união homossexual para garantir os benefícios?
Não. Conforme o STF, basta que essa união seja uma convivência pública, contínua, duradoura e tenha como objetivo constituir uma família. Porém, se for registrado um contrato em tabelionato, ele servirá como prova em uma eventual ação judicial motivada por qualquer razão
2) Que tipo de registro deve ser feito, e onde?
Trata-se de uma escritura pública contendo algumas informações básicas como os nomes do casal, a data de início da união e o tipo de regime de bens escolhido, entre outros dados. Esse registro pode ser feito em qualquer tabelionato, que, a partir da decisão do STF, é obrigado a aceitar o contrato
3) Como provar judicialmente a união estável se não houver formalização?
Nesse caso, o recurso mais comum são depoimentos de pessoas próximas que possam confirmar que se tratava de uma convivência notória entre outras características que configuram a união estável. A lei não especifica duração mínima para o relacionamento ser considerado estável, o que fica sujeito à avaliação
4) Ainda será necessário ir à Justiça para garantir alguns direitos?
Em determinados casos. Adoção, por exemplo, deve ser feita por via judicial. Partilha de bens ou pagamento de pensão alimentícia também podem acabar na Justiça. Porém, os casais homossexuais serão vistos pelos tribunais como qualquer outro casal e poderão reclamar os mesmos direitos
5) Como fica o recebimento de pensão em caso de morte?
O INSS já reconhecia esse tipo de benefício para casais gays. A partir de agora, sistemas previdenciários estaduais, devem se adequar à nova norma. No caso de previdência privada, o cônjuge gay também pode ser incluído como beneficiário. Se um cônjuge do casal gay morrer e o outro for dependente financeiro, tem direito à pensão
6) Alguns institutos não pagam pensão para viúvo que dependia da mulher. Mas deve pagar para viúvo que dependia de outro homem?
Conforme o advogado Rolf Madaleno, sim. Alguns institutos não pagam pensão a viúvo heterossexual por uma determinação do regulamento – que não seria alterada pela decisão do STF. A avaliação do advogado, porém, é de que a medida do STF exige o pagamento nestes casos
7) Em caso de separação, deve haver pagamento de pensão alimentícia?
Depende. Vale a mesma regra aplicada para os casais heterossexuais. Se um dos parceiros provar legalmente que depende financeiramente do outro, sem meios próprios de sobrevivência, tem direito a receber pensão alimentícia. Caso contrário, não há obrigatoriedade no pagamento da pensão (MARCELO GONZATTO - Jornal de Santa Catarina-07.05)
'Direitos iguais'
Teresina - Por 10 votos a 1, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na última quinta-feira, que não há qualquer diferença entre as relações hétero ou homoafetivas. Os ministros do STF consideraram que casais formados por pessoas do mesmo sexo formam uma família quando existe uma união estável e, por isso, têm os mesmos direitos e deveres. Na prática, a sentença do STF dá a pessoas do mesmo sexo segurança jurídica em relação a alguns direitos como pensão, herança, compartilhamento de planos de saúde, entre outros.
A decisão do STF representa um avanço na compreensão dos direitos e uma modernização da justiça brasileira, mas não possui poder para exterminar o preconceito. Ainda há um longo caminho a trilhar para que casais homoafetivos possam demonstrar em público o afeto que os une sem que pessoas se sintam agredidas.
A decisão do STF, a rigor, não seria necessária se não vivêssemos num outro modelo de sociedade, em que o respeito às
diferenças - e não a tolerância - fosse a mola propulsora de nossas ações. Se a mais importante lei do país, a Constituição Federal, em seu artigo 5°, assegura que "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade", seria bem razoável pensar que a orientação de desejo de uma pessoa não a excluiria da proteção legal.
Ainda que a união de pessoas seja regida pelo Código Civil, este se subordina à Constituição e, portanto, deve observar o disposto no artigo 5°. A decisão do STF só se fez necessária por ainda haver intolerância e preconceito em nosso meio. Não se trata aqui de concordar ou não com a união de pessoas do mesmo sexo, mas de respeitar a orientação de cada um, assim como esperamos que respeitem nossas escolhas pessoais.
Cada pessoa é diferente e, como tal, possui diferentes orientações, inclusive no que se refere a relacionamentos afetivos. O desejo de cada um está orientado para determinado perfil de homem ou de mulher: magro, gordo, alto, baixo, não importa. O que realmente importa é que somos todos diferentes, mas iguais perante a lei. O que faz uma família configurar-se como tal não é o fato de ser composta por um homem e uma mulher, mas estar envolta em afeto, respeito, companheirismo e cumplicidade. O Supremo Tribunal Federal finalmente enxergou isso.Falta cada um de nós fazer o mesmo.
Fonte: Portal O Dia
Comentário do blogueiro
A decisão do STF coloca uma pá de cal, nas discussões frenética e cercado de dogmas religiosos no congresso nacional, quando na verdade esta discussão é de direito civil e de cidadania. O livre arbítrio e o respeito as diversidade sexual é um pilar fundamental de uma sociedade democrática. O Brasil deu um salto importante neste sentido. Os fundos de pensão que ainda criam dificuldades devem se adequar o mais rápido o possível em seus regulamentos. No Postalprev já há previsão de inscrição de beneficiários do mesmo sexo.
0 comentários:
Postar um comentário